Lucas Headquarters #168 – Crónica do estado atual da AEW
Ora então
boas tardes, comadres e compadres!! Como estão, tudo na maior? Sejam bem-vindos
a mais uma edição de “Lucas Headquarters” aqui no WrestlingNotícias!!
Ora bem,
2024 caminha, a passos largos, para o seu eclipse, e mesmo que não seja (ainda)
a altura de fazer balanços, avaliações e retrospetivas, há cenários e opiniões
que se vão começando a desenhar com o fim de mais um ano. Normalmente, esses
cenários e essas opiniões são muito gerais, muito superficiais, ou, como se
costuma dizer, muito “pela rama”.
Hoje é noite de Full Gear, por isso achei por bem trazer a
AEW para cima da mesa no artigo desta semana. Vocês já tiveram aquela
experiência ou sensação de vos falarem num PPV/PLE e não conseguirem
dissocia-lo de um combate? Eu pergunto-vos isto porque é uma sensação que estou
constantemente a experimentar. Por exemplo, quando se fala em WrestleMania 25,
qual é o primeiro combate que vos vem à mente? Undertaker vs Shawn Michaels,
suponho. E o combate foi tão bom, mas tão bom, que vocês simplesmente focam
naquele e esquecem-se do resto. É como se aquela WrestleMania só tivesse tido
aquele combate no card.
Isto foi uma sensação que eu já experimentei, por exemplo, no
STARDOM Dream Queendom de 2022. Bem sei que nesse PPV a Mina Shirakawa
regressou de uma lesão, bem sei que as Pink Kabuki (dupla que a Mina
tinha com a Unagi Sayaka) acabaram nessa noite… mas a minha mente não consegue
não resumir aquele PPV apenas ao combate entre Giulia e Syuri pelo World of
STARDOM Championship, o culminar de uma storyline épica e, pessoalmente
falando, um dos meus combates favoritos de sempre (e não, não digo isto apenas
porque a Giulia venceu: Aconselho qualquer um que tenha a oportunidade a ver
este combate).
O mesmo acontece quando me falam no Full Gear. Bem sei que
houve um Four Way Tag Team Match entre Ricky Starks e Big Bill, La Facción
Ingobernable, os FTR e ainda os Kings of the Black Throne pelo AEW World
Tag Team Championship; bem sei que houve um Triple Threat entre a Julia Hart, a
Kris Statlander e a Skye Blue pelo TBS Championship; bem sei que houve MJF vs
Jay White pelo AEW World Championship, mas as memórias daquele Texas Death
Match entre o “Hangman” Adam Page e o Swerve Strickland alugaram um espaço a
termo incerto na minha memória, e a melhor parte é que não têm de pagar
qualquer renda pelo aluguer.
Portanto, passado um ano, quando vejo que estamos a chegar a
mais um Full Gear vêm-me à memória (quase) todos os spots que fizeram desse
combate o combate do ano passado, na minha humilde opinião: Adam Page armado em
vampiro a beber o sangue da testa de Strickland, a resposta deste último com um
Death Valley Driver num tijolo, a cadeira amarrada em arame farpado…
enfim, para os saudosistas da ECW este combate foi um autêntico tratado. Para
eles e para mim, que gosto sempre de ver o circo pegar fogo, ainda para mais
quando o cenário é um ringue de wrestling.
E porque é que, em noite de Full Gear, eu decidi falar na
WrestleMania de há década e meia, e mais no Full Gear do ano passado,
recordando com alguma saudade esse bárbaro combate que dois wrestlers tiveram,
num inesperado ataque de nostalgia? Porque tenho a sensação que tanta, mas
tanta coisa mudou desde Novembro de 2023.
No que toca a opiniões dos fãs de wrestling sobre o
que está a correr bem e a correr mal, vê-se de tudo um pouco. Há os tribalistas
declarados que vestem a camisola das empresas como se disso dependesse a
própria vida, há outros que o fazem mais disfarçadamente, usando a adversativa
“é verdade que (…) mas (…)” e há outros, infelizmente poucos, que têm a cabeça
necessária para discernir o que está bem e o que não está. Infelizmente, quase
todos caímos nos primeiros dois grupos.
E falo-vos sobre isto porque tenho visto isto a acontecer
muitas vezes (é o pão nosso de cada dia de quem, como eu, julga que está no negócio há anos e que, por
essa razão, percebe mais disto do que o fã casual), mas tenho visto isto a
acontecer frequentemente com algo que há um ano não julgava que acontecesse: A All
Elite Wrestling.
No entanto, o facto de eu gostar da AEW e daquilo que ela
representa para o mundo do wrestling não me impede de, de tempos a
tempos, dar uma distância da empresa. De facto, já o fiz com a WWE entre 2019 e
2021, quando a AEW apareceu e entregou, durante esse período de tempo, o
produto com a melhor qualidade que alguma vez poderia entregar. Hoje em dia, no
que diz respeito a AEW, acompanho apenas os PPV’s, embora esteja
suficientemente bem informado para perceber o que se passa nos shows semanais.
Este pequeno mea culpa da minha parte serve-nos, pois,
para fazer aquilo que eu já há várias semanas ando a pensar fazer mas que só
esta semana tive tempo livre suficiente para poder dedicar-lhe algum tempo: Uma
crónica – ou radiografia, se assim quisermos – ao estado em que se encontra
a AEW.
Mais uma vez, preciso que entendam que esta “crónica” que me
disponho a fazer não deve ser entendida negativamente. Sim, eu vou
maioritariamente apontar aspetos nos quais a AEW deve melhorar (afinal, só
assim é que se consegue fazer uma análise consistente), mas faço-o porque
acredito que a AEW tem o que preciso para voltar a entregar um produto com a
qualidade daquele que entregou entre 2019 e 2021. Mas, se quiserem, também
posso fazer uma crónica ao estado atual da WWE e outra ao estado da STARDOM,
numa espécie de minissérie, apenas por uma questão de “justiça opinativa”.
Não é segredo para ninguém – acho que já ficou implícito
neste artigo – que o produto da AEW está no ponto mais baixo desde a sua
fundação em 2019. Mas também é interessante observar que, enquanto isso
acontece, não existe uma declarada falta de qualidade do produto apresentado.
Isso deve-se, acima de tudo, à enorme e indiscutível qualidade de alguns dos
ativos mais valiosos que a empresa tem de momento: Jon Moxley, Swerve
Strickland, Mercedes Moné, Willow Nightingale, Will Ospreay são apenas
alguns dos nomes que asseguram que apesar do decréscimo, o produto no seu todo
ainda está muito longe de definhar. No entanto, quais são os fatores que
fazem com que o produto da AEW não seja tão apelativo agora como há três,
quatro anos?
Na minha opinião, há três causas que são responsáveis por
tirar algum do brilho que o produto da AEW teve no passado, alguns que até já
mencionei noutros artigos: A “bolha” de Tony Khan, o pouco tempo dedicado ao
wrestling feminino e as constantes menções à concorrência.
A “bolha” de Tony Khan
É perfeitamente normal que, quando estamos à frente de uma
empresa, a queiramos defender e achemos que ela é melhor do que a concorrência.
Não há, a meu ver, mal absolutamente nenhum com isso e até é exequível que isso
aconteça, quando feito com consciência. E é isso que não acontece.
Por outro lado, não é segredo para ninguém que a WWE sempre
olhou com uma certa relutância para wrestlers de etnia negra, sobretudo
na hora de os colocar no topo: O tratamento dado a estes três nomes ao longo
dos anos é um excelente exemplo disso, mas há também a questão do reinado de
Mark Henry como World Heavyweight Champion, do próprio reinado de Kofi Kingston
como WWE Champion (que não foi mau, mas terminou de uma forma vexatória para
alguém que era, na altura, uma das principais caras da empresa e que tinha
chegado a esse reinado já com um currículo de respeito). O próprio Big E teve
um reinado de apenas 110 dias como WWE Champion e foi derrotado pelo mesmo wrestler
que, em nove segundos, escreveu o final mais infeliz possível para o conto
de fadas de Kofi.
No entanto, mesmo com todos estes senãos, Kofi Kingston é um
dos wrestlers mais populares da WWE já há mais de 13 anos. Os New Day
têm estado continuamente em destaque ao longo da última década, e com o
possível turn de Xavier Woods a acontecer, não me parece que isso mude.
Para além disso, a WWE renovou recentemente o contrato dos Street Profits, o
que pode indicar que virá aí um push (finalmente) e parece estar a
construir wrestlers negros numa perspetiva de futuro: Je’von Evans e Oba
Femi são os mais brilhantes exemplos disso.
Embora Tony Khan possa ter alguma razão no que diz, o seu
ponto de vista parece-me demasiado enviesado: Lá porque Swerve e os Hurt
Syndicate tenham sido maltratados na WWE e estejam agora a disfrutar de
sucesso, não significa que a WWE, com todo o seu historial de relutância a wrestlers
negros, não tenha tido alguns em posição de destaque contínuo. Como
diria um certo Triple H, sometimes you need to see the bigger picture.
Pouco tempo dedicado ao wrestling feminino
Esta tem sido, creio, a principal razão pela qual muito
público se tem afastado da AEW. E isto não tem que ver com o facto de Giulia,
Stephanie Vaquer e ZARIA estarem a dominar o NXT (afinal, quem tem Mariah May,
Hikaru Shida, Mercedes Moné, Toni Storm, e, ainda que a espaços, Mina
Shirakawa, não se pode queixar de falta de talento).
O problema é o tempo que lhes é dedicado. Enquanto a WWE põe as suas mulheres a carregar episódios do NXT às costas semana após semana, dedicando-lhes 30 a 40 minutos em cerca de hora e meia de episódio (e, se contarmos com RAW e SmackDown, o tempo ultrapassa mais de uma hora), no total de todos os programas, a AEW dedica às suas mulheres… 36 minutos. Num mundo do wrestling em que os fãs já perceberam que as mulheres são tão capazes quanto os homens, dedicar-lhes 36 minutos é quase o equivalente a passar-lhes um atestado de incompetência.
Wrestling Has More Than One Royal Stopwatch ⏱️
— Cigano (@Cigano300) November 17, 2024
Women's wrestling across all WWE programming: 1:12:14
Women's wrestling across all AEW programming: 36:17 pic.twitter.com/of8RizoOZR
As constantes menções à concorrência
Este é um tema que eu já tinha abordado por altura da
WrestleMania, quando surgiu aquela “polémica” em que Triple H disse que só
queria na WWE wrestlers que estivessem dispostos a dar o litro, e Will
Ospreay entendeu mal e respondeu com uma promo bastante inflamada. Surgiu, há três
semanas, uma “sequela” deste incidente, quando a WWE transmitiu o NXT desde a
2300 arena e Christian Cage criticou a ECW original.
Christian Cage buries the fxck out of Taz and ECW, this is NASTY! #AEW #AEWDynamite
— 🅰️🅾️ (@KXNGAO) November 7, 2024
pic.twitter.com/KvOYBmmQvu
E agora pergunto: Para quê isto? Para quê esta necessidade de se estar constantemente a criticar a concorrência quando sabemos perfeitamente que a concorrência não quer saber do que se passa no outro lado da barricada.
Eu compreendo, Tony Khan ainda é muito jovem comparado com
quem tem tomado conta da WWE nas últimas décadas. De facto, até ao pé do
próprio Triple H, que está na flor da sua meia-idade, Tony Khan parece uma
criança. Se tivéssemos que entrar em comparações, diria que Tony Khan é aquele
aluno nerd que quando tira 20 é o mais irritante da sala, e que quando,
por descuido, tira um 15, a culpa é do stor Hunter. Portanto é
perfeitamente natural que Tony Khan queira ter nos seus shows segmentos
que denigram a concorrência: Quando somos novos, gostamos sempre de ver o mundo
a arder.
A questão é que, por mais “engraçado” que isto possa parecer,
tudo isto não passa de uma valente picuinhice. E a picuinhice tira o foco,
distrai, faz-nos preocupar com o que não é, de todo, o mais importante. A AEW
precisa de evoluir, precisa de olhar para dentro e perceber porque é que existe
como alternativa. E não é a comprar guerras com a concorrência que o vai fazer.
Em suma, estes são apenas três dos problemas com que a AEW se debate atualmente. Se há outros que a impedem de atingir o seu potencial? Sem dúvida, mas esses talvez sejam aqueles que Tony Khan não consegue controlar por sua própria vontade. Estes, contudo, são três tópicos que estão perfeitamente ao seu alcance, e ignorá-los semana após semana parece-me um tanto quanto negligente. E por tudo aquilo que já fez pelo wrestling, negligência é uma acusação que a Elite não merece ostentar.
E vocês, que análise fazem ao atual momento da AEW? Que
problemas apontam? Como os corrigiriam?
E assim termina mais uma edição de “Lucas Headquarters”!! Não
se esqueçam de passar pelo nosso site, redes sociais, deixem a vossa opinião aí
em baixo… as macacadas do costume. Para a semana cá estarei com mais um
artigo!!
Peace and love, até ao meu regresso!! Que seja um Full Gear para mais tarde recordar!!