Lucas Headquarters #211 – IYO vs Mayu: Uma História maior que o próprio joshi
Ora então boas tardes, comadres e compadres!! Como estão?
Sejam bem-vindos a mais uma edição de “Lucas Headquarters” aqui no
WrestlingNotícias!! Pensavam que eu ia e já não voltava? Pois é, meus caros
comensais do wrestling, depois de um
mês de Setembro em que me ausentei durante uns dias para disfrutar da companhia
da família e limpar um pouco a cabeça (tendo, ainda assim, conseguido colocar
os artigos a tempo e horas), eis que Outubro não foi mais piedoso comigo.
Por entre momentos em família e apoios politicamente
discretos, fui obrigado a fazer uma pausa de três semanas no estaminé, não
porque já estivesse farto disto (embora às vezes seja um bocadinho frustrante
querer muito escrever um artigo, chegar a quinta/sexta-feira e não ter um
tópico) mas porque o tempo simplesmente não dava para mais.
Mas pronto, cá estamos nós de volta, desta vez com a
expectativa de não ter de voltar a passar por tão prolongado interregno. E,
para surpresa de ninguém, é quando uma pessoa não está presente que acontece
todo o tipo de coisas. Quando estamos em cima do acontecimento… vemos o tempo a
passar. Vejamos:
MIRAI saiu da MARIGOLD;
AEW WrestleDream foi (como seria de esperar) um sucesso;
Mayu Iwatani e IYO SKY vão enfrentar-se já hoje, no MARIGOLD Grand Destiny!!
Estão a ver? É como se o wrestling
fosse um adolescente com as hormonas aos pulos e eu fosse o pai! E esse
adolescente está sempre desejoso de apanhar o papá fora de casa durante uns
dias para ver se chama os amigos todos e dá uma daquelas festas de arromba sem
ser apanhado!
De resto, há um acontecimento que marca, sem sombra de
dúvida, este fim de semana, que é precisamente o ta, combate entre IYO SKY e
Mayu Iwatani no MARIGOLD Grand Destiny.
E esse combate – que, de resto, é um fortíssimo candidato a
combate de 2025 – traz-me à memória um conceito que já tenho falado muito aqui
no espaço, embora de forma muito leve e muito contextual: O conceito de wrestling soulmates, ou traduzindo ao pé
da letra, “almas gémeas do wrestling”.
Mas para falar de almas gémeas do wrestling,
é preciso falar de um outro conceito que agora está na moda quando se fala
de wrestling: Química.
E falar de química, como é óbvio, não é falar daquela área da
ciência que nos dá dez mil fórmulas para decorar e mais a tabela periódica.
Química, quando falamos de wrestling,
é um conceito muito mais abrangente, pela simples razão que não se tem química
com todo o wrestler. A química, no wrestling, depende de muitas coisas:
Depende do estatuto das wrestlers em
questão, depende do estilo de cada uma e muitas vezes da trajetória da
carreira.
Quando falamos em joshi
wrestling, não há wrestlers que
personifiquem o conceito de wrestling
soulmates e que tenham tanta química como as “Peach Rock”: IYO SKY e Mayu Iwatani. E quando
olhamos para as Thunder Rock, percebemos que aquilo que as une cria uma
história, uma história muito maior do que a do próprio joshi puroresu.
A influência de Mayu:
Dar novos mundos ao joshi
Recuemos sete anos no tempo até 2018. Fazendo a ponte entre
2018 e 2025, não será difícil constatar que o joshi era, há sete anos, um mundo completamente diferente daquilo
que é hoje. Em 2018, o wrestling feminino
japonês era um nicho dentro do nicho que o wrestling
já se havia tornado há quase uma década. Nenhuma empresa de joshi, das poucas que havia e eram
conhecidas (isto não contando com a STARDOM, que era, na altura, a líder do
mercado – estatuto que mantém até hoje) se aventurava a fazer shows para além do Korakuen Hall.
Uso 2018 como referência pela simples razão de que foi em
2018 que a carreira de IYO SKY tomou um novo rumo, quando a Genius of the Sky assinou pela WWE. Mas,
para se perceber o impacto de IYO SKY na indústria do joshi, temos que recuar ao período de 2015-2016, quando tanto IYO
SKY como Mayu Iwatani tiveram uma série de combates, cada um melhor que o
outro, e que consolidaram os dois nomes como pilares do wrestling feminino japonês. Importante também é recordar o combate
entre IYO SKY (na altura com o ring name Hitokiri)
contra Pentagon Dark (aka Penta), que colocou muita gente a olhar para o joshi de uma maneira que antes era
impensável.
Mas vamos voltar a 2018. IYO SKY deixa a STARDOM rumo à WWE,
delegando a Mayu Iwatani a difícil tarefa de aguentar um barco que, nos últimos
anos, navegava por “mares nunca dantes navegados”. Nos últimos sete anos, Mayu
Iwatani foi a cabeça de uma das melhores gerações do joshi, que incluiu nomes como Utami Hayashishita, Maika, Giulia, Arisa
Hoshiki, Saya Kamitani, só para citar alguns.
Essa geração foi a grande responsável pelo ressurgimento do joshi enquanto fenómeno de popularidade:
Utami Hayashishita com um excelente trabalho de construção de personagem
complementado por um trabalho em ringue igualmente excelente; Arisa Hoshiki com
um excelente reinado como Wonder of STARDOM Champion, qualitativamente
ultrapassado apenas pelo de Saya Kamitani, que infelizmente terminou de forma
triste e abrupta, com o adeus forçado de Hoshiki aos ringues devido a lesão;
Giulia pela sua abordagem que mistura a habilidade joshi em ringue com a
construção de personagem do wrestling feminino
europeu; e Saya Kamitani, que subiu a pulso.
A trajetória de Kamitani, sem desprimor, por exemplo, para a de Giulia (que chegou à WWE e é atual Women’s United States Champion) merece particular atenção: A Phenex Queen foi o braço direito de Utami Hayashishita nas já saudosas Queen’s Quest, teve o melhor reinado como Wonder of STARDOM Champion desde, precisamente, Arisa Hoshiki, com os combates contra Hazuki já na ponta final do seu reinado a serem particularmente marcantes, arriscou e, com coragem, abraçou uma personagem heel que, inicialmente, parecia não ter grande efeito, mas que também ela foi capaz de rentabilizar. E hoje é, com justiça, World of STARDOM Champion, estando no topo da montanha da empresa.
Poder-se-á dizer – e com propriedade – que, na ausência de
IYO SKY, o joshi não só evoluiu em
popularidade como prosperou em termos geracionais. E não seria descabido
atribuir este crescimento a nível geracional a Mayu Iwatani, sobretudo no seu
trabalho de estabilização do balneário após o adeus prematuro de Hoshiki e a
trágica morte de Hana Kimura. Mayu Iwatani deu novos mundos ao joshi wrestling, assumindo uma posição
que não era fácil e assegurando que o balneário não perdia nem qualidade, nem
foco após as referidas tragédias.
IYO SKY: Hard
work pays off
Falemos, agora, de IYO SKY – ou Io Shirai, se preferirem
fazer um exercício de saudosismo e encarar o combate de amanhã como se ela
ainda estivesse no Japão. IYO SKY é uma daquelas wrestlers cujo sangue
lhe corre definitivamente nas veias: A irmã, Mio Shirai, já havia marcado a sua
posição no início da década de 2010 como uma das principais wrestlers da
então emergente cena joshi, tendo sido atirada para a ribalta ao lado de
IYO e também de… Asuka (na altura conhecida como Kana), num trio chamado Triple
Tails. Portanto, talvez a chegada à WWE em 2018 não tenha sido apenas uma
mera coincidência.
Os primeiros anos de IYO SKY na WWE não foram, de todo, fáceis. Não porque a sua capacidade estivesse em dúvida – ela chegou à final do segundo Mae Young Classic – mas porque o foco do wrestling na América, como sabemos, é bem diferente do foco do wrestling no Japão. No Japão, ter uma boa gimmick é meio caminho andado, mas não é tudo. Na América – e na WWE em especial, ter uma boa gimmick pode ser a diferença entre o sucesso e promessas adiadas.
Felizmente, IYO soube trabalhar esse problema. Como? Com um heel turn. Parecia remédio santo, já que a Genius of the Sky já estava ambientada à dinâmica da WWE e sabia que um babyface muito unidimensional – à falta de melhor termo – não resultaria. E foi, em parte. Em parte porque sim, IYO SKY tornou-se heel, mas o público do NXT já sabia bem o que é que ela valia e nunca deixou de estar do lado dela. E IYO SKY, com o tempo, tornou-se tweener, mantendo a postura heel mas deixando-se levar pelo apoio do público.
O mesmo não aconteceu com o público da WWE – e eu fico sempre
a pensar como é que dois públicos que veem um produto do mesmo “sistema” têm
sempre reações tão diferentes. Quando IYO SKY chegou ao Main Roster, foi como
se o público ainda não soubesse do que é que ela era capaz. Com Bayley e Dakota
Kai do seu lado nas Damage CTRL, a coisa parecia fluir lindamente, mas o
público mantinha sempre algumas reticências.
Até que IYO SKY foi obrigada a fazer algo inesperado na WWE:
Mudar o foco. E isso é algo que não é nada fácil de fazer porque a própria
empresa limita muito os seus wrestlers em nome da segurança. No Survivor
Series de 2023, IYO SKY protagoniza um spot em que faz um crossbody do
topo da jaula com o caixote do lixo a cobrir-lhe o corpo, deitando por terra
toda a competição. Na WrestleMania XL, ao desafiar Bayley pelo título,
protagoniza um dos combates do PLE. E o público, finalmente, percebe o que é
que andava a perder.
Quando se diz que IYO SKY não teve tempos fáceis quando
chegou à WWE, não foi por problemas de adaptação – essa seria a desculpa mais
usada e a via mais fácil de justificar um possível insucesso. IYO SKY teve
tempos difíceis na WWE porque, inicialmente, não soube encontrar uma forma de rebentar
a tradicional “bolha” em que o público da WWE normalmente insiste em se meter.
Mas conseguiu.
Conseguiu fazê-lo porque, com o seu trabalho, lembrou à WWE aquilo
que os fãs já estão quase carecas de dizer: Sports Entertainment é
apenas uma forma de classificar o wrestling, mas não deve ser levada à
letra. Tal como o que se passa em Vegas fica em Vegas, no ringue tem sempre que
prevalecer o que se faz dentro do ringue. Tudo o resto é acessório.
Porque é que o combate entre IYO SKY e Mayu
Iwatani tem tanto significado?
Quem for
relativamente novo nas lides do wrestling ou estiver a descobrir o wrestling
feminino japonês há meia dúzia de meses, perguntar-se-á com naturalidade
porque é que os fãs olham para o combate entre IYO SKY e Mayu Iwatani com tanto
significado e entusiasmo. Há duas formas de responder a esta pergunta: Uma mais
simples e direta, outra mais complexa e muito ligada ao legado que deixaram na STARDOM.
A forma mais simples e direta corresponde a uma data: 13 de
Julho de 2024. Foi nessa data que IYO SKY voltou ao Japão pela primeira vez em
seis anos para enfrentar Utami Hayashishita no MARIGOLD Summer Destiny, naquele
que foi um dos combates que mais marcou o ano passado. E se a coisa correu tão
bem, porque havia Rossy Ogawa de querer desperdiçar outra oportunidade?
happy one year anniversary of iyo sky vs utami hayashishita pic.twitter.com/m2gcDcFvKU
— Iann 🇵🇷 (@IyosMoonsault) July 13, 2025
A forma mais complexa está, como disse, muito ligada à história que tanto a Icon como a Genius of the Sky deixaram na STARDOM. Ambas dominaram a empresa enquanto lá estiveram, mas fizeram-no quase em sucessão hereditária: IYO SKY esteve no topo até 2018; Mayu Iwatani, como disse, aguentou o barco, tomou o seu lugar e chegou ao topo da montanha pouco depois, com enorme sucesso.
Mas os anos passaram. Os anos passaram e, mesmo com os
grandes combates que IYO SKY e Mayu Iwatani nos deixaram enquanto estiveram na
STARDOM, houve sempre aquela dúvida. IYO SKY mudou o seu estilo – naturalmente –
e teve de trabalhar para alcançar a relevância na WWE; Mayu Iwatani permaneceu
sempre igual a si própria e conseguiu, mesmo com as constantes transformações
do joshi e a sua entrada no mainstream, manter-se sempre
relevante. Em que ponto estão ambas as wrestlers passados sete anos?
Será que ainda serão capazes de entregar um combate à altura daqueles que
entregaram há uma década?
O entusiasmo dos fãs vem, também, da necessidade de encontrar
respostas a estas perguntas. Eu diria que 98% deles tem a certeza que sim, que
apesar de todas as transformações por que passaram as suas carreiras, IYO SKY e
Mayu Iwatani não perderam qualquer química. Mas o medo da ação da WWE no estilo
de IYO também tem de ser algo a ter em conta, e os fãs percebem isso.
IYO SKY nunca será capaz de nos entregar, por si só, um combate
classificado puramente como “mau”. Mas a insistência da WWE em jogar pelo seguro
com wrestlers que são capazes de fazer muito mais do que apenas isso
pode ser a diferença entre o combate do ano e um combate bom, apenas e só.
Portanto eu diria que temos aqui entusiasmo, sem dúvida. Mas
também temos entusiasmo misturado com algum receio. Há um nome para isso:
Curiosidade. E quando o entusiasmo e a curiosidade se misturam em redor de um
combate… metade desse combate fica feito. Quanto ao resto, é só ouvir soar a
campainha e deixar IYO e Mayu fazer aquilo que sempre souberam. Afinal de
contas, um combate destes é como o Melhoral: Se as wrestlers não
estiverem bem, também não hão de nos deixar ficar mal.
E vocês, que expectativas têm para o combate de amanhã entre
IYO SKY e Mayu Iwatani?
E assim termina mais uma edição de "Lucas
Headquarters", com as devidas desculpas pela lonjura do artigo :P. Não se
esqueçam de passar pelo nosso site, pelas nossas redes sociais, deixar
sugestões aí em baixo... o habitual. Para a semana cá estarei com mais um
artigo!!
Peace and love, até ao meu regresso!!








