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Musas do Wrestling #03 - Será que o Sexo Vende?


Bem-vindos ao Musas do Wrestling!

Nesta edição, depois do regresso das férias, ponderei diversos temos, desde promotoras, às rivalidades da atualidade, mas os comentários à edição anterior deixaram-me com vontade de abordar um infindável assunto, o da objetificação feminina. 

Na edição sobre a World Wonder Ring Stardom (que podem ler aqui), um leitor comentou acerca da referida companhia dar grande ênfase aos catálogos e calendários de bikini como importante fonte de rendimento, e como tal dar centralidade ao aspeto físico, adotando uma vertente objetificante das suas atletas.
Io Shirai, Kairi Hojo e Mayu Iwatani posam para um calendário da promotora japonesa Stardom

Parece fácil de refletir sobre isto? Mas não é. Todo este assunto daria para vos maçar com milhares de carateres de crónica, mas prometo tentar ser o mais sucinta possível. E como o wrestling tem na sua base um negócio que gera e move enormes receitas, sendo essa a razão normalmente apontada para a sexualização das mulheres, decidi basear esta crónica numa grande e fulcral questão - "Será que o Sexo Vende?".

É um cliché da nossa sociedade capitalista, todos nós já repetimos vezes sem conta que, seja na televisão, como na publicidade, nos videojogos, na internet - o sexo vende!- e por sexo entenda-se a exposição do corpo feminino enquanto objeto de desejo, na grande maioria das vezes. Até mesmo no desporto, todos conhecemos as diferenças entre os ângulos de câmera entre um jogo feminino e um masculino, no volley de praia. Mas e no wrestling? Será assim?

Primeiro, devemos pensar que vivemos numa sociedade patriarcal, isto é, constituída considerando o homem como figura central, e todos crescemos nela e somos um produto dela. O que é que isso significa? Que todos nós devemos evitar ao máximo ser sexistas, mas que é um trabalho muito árduo, porque o somo quase "naturalmente" e, tal como nós, todos os creativos, bookers, writers e etc também o são. 

Quem me conhece sabe que sou uma feminista mais que convicta e só hoje, ao escrever esta crónica, me apercebi que até o nome dela "Musas do Wrestling", podia ser ele próprio objetificante, e dar a ideia das mulheres como uma figura de inspiração no wrestling, mas não necessariamente uma figura ativa e de participação. Dá que pensar, não?

Qualque fã de wrestling sabe que, na modalidade, e sobretudo no circuito mais mainstream, como na WWE, sexualização e wrestling feminino andaram durante muitos anos de mãos dadas. A própria companhia, não procurava lutadoras, procurava modelos e mulheres dentro do padrão de beleza em geral, para fazer delas uma espécie de lutadoras.

Nenhuma das 8 finalistas do WWE Diva Search de 2006 tinha qualquer experiência de wrestling quando foi seleccionada pela companhia

Os combates duravam só o tempo suficiente para se ir à casa de banho, e tinham estipulações mais diversas, como o famoso Bra and Panties (que vemos na imagem inicial da crónica). Qualquer Halloween ou Natal era pretexto para um desfile de indumentárias sensuais, com a participação de todas as Divas.

Mae Young participa numa mostra de fato de banho durante a Royal Rumble de 2000

Verdade é que, em circuitos indies, a qualidade do Wrestling feminino foi sempre superior, mesmo que durante algum tempo não fosse muito acentuada essa diferença, e esta era a resposta rápida à nossa questão de base. A WWE é a companhia com maior preocupação em gerar receitas e assim conseguia fazê-lo, por isso, a resposta é sim, o sexo vende!

Mas não será todo este argumento uma enorme falácia? Ora vejamos, num mundo dominado por homens, como o do Wrestling, os combates femininos da WWE nunca conseguiram passar de uma espécie de intervalo prolongado. Nunca nenhum aspirante a wrestler se inspirou no move set da Torrie Wilson creio eu, e lucros, só os da venda de alguns posters com divas em bikini.

As poucas atletas femininas que recebiam grandes pops, eram mesmo as que tentavam, contra tudo o que lhes era pedido, fazer algo o mais parecido possível com um combate de pro wrestling quando entravam no ringue, e que se destacavam pelo seu atleticismo, técnica ou força, mais do que pelo seu corpo, veja-se os exemplos de Trish Stratus, Lita, Chyna ou Alundra Blayze.

Em 2004, Trish Stratus e Lita, foram as primeiras mulheres a lutar no main event da RAW

A resposta mais adequada à nossa questão é capaz, então, de ser um redondo não. Nunca, em nenhuma fase da história da WWE, a divisão feminina foi tão lucrativa quanto hoje em dia. Geram-se milhares de dólares só com a venda do merchandising das four horsewomen of NXT, sobretudo da Bayley. Tão lucrativa que a companhia calculou que seria lucrativo suportar os custos de produção de um torneio inteiro exclusivamente feminino, como o caso do Mae Young Classic.

A WWE lucrou mais com o merchandising de Bayley do que com o de qualquer outra atleta feminina até ao momento

E porquê? Porque as lutadoras usam cada vez gears mais minúsculas? Têm cada vez mais silicone? E a resposta é, mais uma vez, não! É mesmo porque sabem lutar, porque conseguem e podem estar em ringue mais do que 2 ou 3 minutos, e porque a maioria delas treina há muitíssimo tempo, sendo que algumas delas cresceram com o sonho de ser wrestlers, que faz toda a diferença, e não de serem modelos ou apresentadoras.

Esta clara mudança de direção, para uma mais lucrativa e mais dignificante para as atletas, trouxe à tona o interesse do típico fã de wrestling pelas divisões femininas de cada promotora, e pelas promotoras exclusivamente femininas, das quais vamos falando neste espaço. Além disso, abriu espaço a todo um novo conjunto de atletas, menos enquadradas com o padrão de beleza vigente, e que trazem um enorme acréscimo de qualidade à modalidade. Não é Viper?

Viper/Piper Niven é uma atleta fora do padrão de "beleza" e uma das com maior qualidade técnica e experiência a integrar o Mae Young Classic

Quanto ao assunto que acabou por nos trazer até esta discussão, o da Stardom, eu não ignorei a objetificação que está por trás dos calendários, e muito menos penso que tudo o que vem do japão é giro, atlético, indy e impecável. Penso apenas que devemos ser pragmáticos e pensar nos assuntos contextualizados. Seria preferível que a companhia mudasse esta política? Seria. 

Mas, num país onde a imagem feminina enquanto dócil e inocente ou como apenas um objeto, veja-se aquela menina coelha de cabedal que entra com o Takahashi e que cujo o nome nem interessa para a NJPW, ter uma companhia que fomenta as atletas pela sua qualidade em ringue e enquanto personagens centrais de um sem número de storylines, continua a parecer-me louvável.

Bullet Bunny é um mero elemento decorativo da entrada de YujiroTakahashi na NJPW

É importante concluir dizendo que não está tudo conquistado, que ainda há muita objetificação, voluntária e involuntária mas, mais importante ainda é subinhar que, ao que tudo indica, no mundo do wrestling, o bom wrestling vende mais do que a sexualização feminina despropositada.

E como nenhuma discussão é fechada e todas as opiniões são bem-vindas, deixo-vos, esperando sinceramente poder ler aquilo que este tema vos suscita.

Até para a semana!






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